Nossos jornalões e as TVs descobriram que o crack tem culpados: é o governo Lula e os favelados. Se derrubar o Lula e tacar fogo nas favelas, tudo se resolve. É o que se conclui das recentes reportagens, e o que dizem alguns comentaristas nos portais de notícias. Em nenhuma matéria há um dedo sobre informações históricas sobre essa droga que efetivamente destrói em pouco tempo seus usuários, e que foi criada para acabar com o forte movimento dos Panteras Negras nos EUA, obra do próprio estado americano. Inventei? Teoria da conspiração? Não. Quem disse foi esta mesma mídia gorda em uma série de reportagens do San Jose Mercury News, assinadas pelo valoroso e premiado repórter Gary Webb, em 1996.
Webb seguiu os passos do caso Irã-Contras, um dos momentos em que, por um descuido, a cortina que encobre o sistema é levantada e podemos ver a fábrica de salsichas funcionando. Simplesmente o governo americano, via sua central de inteligência, vendia armas para seu inimigo aiatolá Komeini e arrumava mais um bom troco no mercado negro de drogas. Tudo para financiar os caros mercenários que combatiam a revolução sandinista. Uma revista em Beirute deu o flagra, espanou o mau cheiro e deu em uma longuíssima CPI no Congresso Americano.
O jornalista fez seu trabalho com competência. Seguiu passos de traficantes, deu nomes, mostrou rotas de tráfico que eram do conhecimento da CIA, e exibiu todo o cenário. Depois, a série foi transformada em livro: Dark Alliance: The CIA, the Contras, and the Crack Cocaine Explosion. Bastou para o mundo cair sobre sua cabeça. Foi acusado por todos os lados de usar falsas fontes, de manipular informações, sua vida virou um inferno. Perdeu o emprego e entrou em lista negra na mídia americana. Morreu em 2004. Segundo a polícia e a mídia, foi suicídio.
Claro, a nossa mídia aqui não lembrou do fato agora. É muito complexo entrar em um terreno tão polêmico. Imagina então pesquisar, que absurdo.
Ah, só um detalhe, certamente sem relevância jornalística: Gary Webb cometeu suicídio com dois tiros na cabeça.
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Referências para saber mais:
Verbete sobre Gary Webb na Wikipedia (em inglês)
Ótimo texto do professor Ney Jansen sobre drogas. Como o crack derrotou os Panteras Negras.
Sobre o caso Irã-Contras (em inglês)
Beijing
Há 10 horas
9 comentários:
Jurandir excelente texto, adorei.
Gostaria de fazer uma pesquisa sobre a campanha feita em relação aos malefícios do açúcar. Considerando que essa campanha alcançou uma grande dimensão no início dos anos 60, qdo Cuba era um grande produtor de açúcar, a maioria dos livros e "estudos" eram norte-americanos, financiados por entidades norte-americanas e os fabricantes de adoçantes são todos norte-americanos. Sei não, mas acho que aí tem...
Zapper
Fernando, obrigado pelo elogio. Para este blogueiro, a único retorno de interesse é ter leitores interessados em seu texto.
Zapper, é uma ótima pauta. Diria que na história dos EUA, sempre que fuçamos aparecem coisas terríveis. Me lembro do sucesso do livro "sugar blues" nos anos 70. Depois sumiu. Nem desmereço os critérios cietíficos que apontam seus malefícios... mas, há interesses grandes. Já tentaram até criar um falso ataque de Mig contra avião comercial para culpar Cuba...
Jurandir, mais uma vez arrasou. O texto do prof. Ney Janses é muito esclarecedor.Grata
Irã-Contras e Colômbia-Sete bases americanas. Tudo a ver.
Ótimo texto, Jurandir. Parabéns! O "Abunda Canalha" continua afiado. O crack é a bola midiática da vez, mas como nada gruda em nosso presidente-teflon, preparemo-nos, pois nas próximas semanas, nossos intrépidos jornalistas ressuscitarão a polêmica em torno da visita, agora confirmada, de Ahmadinejad ao Brasil (acabei de escrever um post sobre isto). É o desespero dessa gente!
Eu diria: FFHH e a mídia. Ou: a mídia e FFHH. Aliás, sabem qual a diferença entre a droga e FFHH? Para a primeira há tratamento.
Colega blogueiro, posso reproduzir esse texto no Mocotó Elétrico?
Nesse momento a RBS (espécie de Globo do Sul) faz campanha contra o crack, cheia de subjetivas segundas intenções.
Como sou ansioso já postei, se tiver problema me avisas, por favor, um abraço e parabéns pelo trabalho!
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